quinta-feira, abril 12, 2007

Declarações do co-arguido

(texto de Andreia Ribeiro São Pedro, para a sessão de 13 de Novembro de 2006)


· No âmbito do presente trabalho propomo-nos analisar (i) a delimitação do impedimento do co-arguido para depor como testemunha e (ii) o problema da valoração do conhecimento probatório do co-arguido, em particular da sua admissibilidade e eventuais limites.

O IMPEDIMENTO PARA DEPOR COMO TESTEMUNHA

· Neste âmbito a regra normativa constante do CPP mais relevante para a nossa análise consta do artigo 133º: “a) estão impedidos de depor como testemunhas (…) os co-arguidos no mesmo processo ou em processos conexos, enquanto mantiverem aquela qualidade” e n.º 2 “em caso de separação de processos, os arguidos de um mesmo crime ou de um crime conexo podem depor como testemunhas, se nisso expressamente consentirem”.

· E qual será o sentido do impedimento? Esta questão reconduz-se ao princípio da incompatibilidade entre a posição do co-arguido e testemunha no plano do direito probatório:

- O arguido dispõe de um direito ao silêncio relativamente aos factos objecto da sua imputação (artigo 61º, n.º 1, alínea c)), havendo proibição de valoração desfavorável do silêncio total (artigo 343º, n.º 1) ou parcial (artigo 345º, n.º 1) VS Dever da testemunha prestar juramento e responder com verdade às perguntas que lhe forem dirigidas (artigo 132º, n.º 1, alínea d) ainda que tal dever cesse se “alegar que das respostas resulta a sua responsabilização penal” (artigo 132º, n.º 2)

- Recusa do arguido em prestar declarações ou a eventual falsidade das mesmas não configura a tipicidade do crime de desobediência e do crime de falsas declarações VS Dever da testemunha é penalmente tutelado pelo crime de falso testemunho (artigo 360º CP)

Logo poder-se-á concluir que o estatuto do arguido se mostra mais favorável que o da testemunha

A justificação do impedimento de o co-arguido depor como testemunha encontra o seu fundamento numa ideia de protecção do próprio arguido (Medina de Seiça), reconhecendo-se que um dos limites à investigação passa pelo respeito da liberdade de declaração que o Estado tem de reconhecer aos diversos participantes processuais sob pena da verdade ser comunitariamente insuportável (numa palavra reconhecimento do privilégio contra a auto-incriminação), posição que aliás é seguida pelo STJ e Tribunal Constitucional.

Neste sentido vide Acórdão do TC n.º 181/2005:

“A proibição constante do artigo 133º do CPP tem um objectivo muito próprio: o de garantir ao arguido o seu direito de defesa, que facilmente se mostraria incompatível com o dever de responder, e com verdade, ao que lhe fosse perguntado, com as sanções inerentes à recusa de resposta ou resposta falsa”.

· Determinação do âmbito do impedimento: O âmbito objectivo do impedimento (a que crimes está o co-arguido impedido de testemunhar)

Medina de Seiça defende que o âmbito do impedimento deve determinar-se atendendo ao nexo existente entre as imputações dos vários arguidos (conceito material de co-arguido). Nexo que pode afirmar-se quando as imputações digam respeito ao mesmo crime ou crime conexo (cfr. artigo 133º, n.º 2) independentemente de entre os processos dos arguidos existir ou ter existido comunhão processual (vide artigo 24º).

Por último, nos casos em que existe comunhão processual entre os arguidos (artigo 133º, n.º 1) estes não se encontrariam impedidos de testemunhar relativamente aos factos autónomos de outro arguido, i.é., factos que não apresentem o nexo determinante do impedimento (o mesmo crime ou crime conexo).

Neste sentido vide Acórdão do STJ de 28-11-90, BMJ, n.º 401, 449-58:

“A e B irmãs envolveram-se em confronto físico, do qual resultaram lesões corporais em ambas. Um outro irmão, C, tomou partido de A e discutiu com B, que, entretanto, se armara com uma espingarda de caça e em resposta às palavras do irmão disparou sobre este causando-lhe a morte. A e B foram julgadas pelo Tribunal do Júri, acusadas cada uma de um crime de ofensas corporais; B julgada, ainda, pelo crime de homicídio. Na produção de prova do crime de homicídio, A foi ouvida como testemunha, tendo o seu depoimento servido de base à decisão.”

Esta solução porém não encontra base no sentido literal da lei portuguesa, já para não referir as dificuldades de procedimento em conciliar no mesmo processo a posição de arguido com a de testemunha…

· (Cont.) O âmbito subjectivo do impedimento (limites temporais da qualidade de co-arguido)

A qualidade de co-arguido, para efeitos do artigo 133º, adquire-se no mesmo momento em que se adquire a qualidade de arguido do mesmo crime ou de crime conexo ao de outro arguido. Isto significa que não se justifica o alargamento do impedimento ao mero suspeito, sem prejuízo do seu direito a ser constituído arguido nos termos do artigo 59º, n.º 2 e da obrigação de constituição no caso de surgir durante o interrogatório “fundada suspeita” de crime cometido, momento a partir do qual vale o impedimento.

Quanto ao termo da qualidade do arguido julgamos que ocorre desde que tenha carácter definitivo maxime decisão transitada em julgado. Já os casos de arquivamento por insuficiência de prova a intervenção do anterior arguido pode fazer-se nos termos do artigo 133º, n.º 2, ou seja, testemunha mediante prévio consentimento.

Neste sentido vide Acórdão do TC n.º 181/2005:

“Não julgar inconstitucional o artigo 133º, n.º 2 interpretado no sentido de não exigir consentimento para o depoimento como testemunha de anterior co-arguido cujo processo, tendo sido separado, foi já objecto de decisão transitada em julgado.”

O Anteprojecto do CPP porém prevê uma alteração ao artigo 133º, n.º 2 no sentido de considerar abrangidos pelo impedimento mesmo os co-arguidos já condenados por sentença transitada em julgado:

“Em caso de separação de processos, os arguidos de um mesmo crime ou de crime conexo, mesmo que já condenados por sentença transitada em julgado, só podem depor como testemunhas se nisso expressamente consentirem”.

· A violação do impedimento

Em caso de sujeição do co-arguido ao regime da prova testemunhal Medina de Seiça defende que o tratamento deve ser o da proibição de prova, ou seja, a proibição de valoração de todas as declarações prestadas pelo interrogado, as quais não podem utilizar-se contra ele ou contra terceiros. Diferentemente, Germano Marques da Silva sustenta que se está perante uma “mera irregularidade”.

Com interesse para a questão vide Acórdão do TC 304/2004 no sentido de “ser válido o depoimento prestado por co-arguido de um mesmo crime ou crime conexo em processo separado, sem afirmação do seu consentimento expresso, limitando-se a proibição de valoração do depoimento apenas em relação ao depoente de acordo com o artigo 32º, n.º 1 e 8 da CRP.”

A VALORAÇÃO DO CONHECIMENTO PROBATÓRIO DO CO-ARGUIDO

· A questão a discutir prende-se com a análise da possibilidade da valoração das declarações do co-arguido contra outro co-arguido, ou seja, se a interdição do testemunho impõem ao aplicador a desconsideração da parcela de conhecimento dessa forma adquirido não o levando aos fundamentos da decisão.

· Importa assim fazer algumas breves referências aos princípios gerais em matéria de prova no direito processual penal português.

No direito processual penal português a regra em matéria de prova é a da atipicidade que se traduz na admissibilidade de qualquer meio de prova e de toda a forma de obtenção a não ser que a lei expressamente a exclua (vide artigo 125º).

Por outro lado, o valor dos meios de prova também não está legalmente preestabelecido, ou seja, o tribunal apreciá-las-á segundo a sua “livre convicção” de acordo com o bom senso, experiência de vida, capacidade critica (artigo 127º), devendo fundamentar lógica e racionalmente as opções que toma.

Acresce que o juiz tem poderes autónomos de investigação (artigos 289º, 290º e 340º) o que, sem dúvida, se conjuga com o princípio da verdade material (descoberta da verdade).

Por último, se o juiz finda a produção de prova num processo, não consegue superar alguma dúvida (se o arguido cometeu o crime ou não, se os pressupostos de facto de uma causa de exclusão da ilicitude ou da culpa se verificaram realmente) deve decidir a favor do arguido de acordo com o princípio in dubio pro reo (artigo 32º, n.º 2 da CRP).

· As proibições de prova constam do artigo 32º, n.º 8 da CRP e do artigo 126º, declarando-se inadmissíveis as provas obtidas mediante tortura, coacção ou, em geral, ofensa da integridade física ou moral das pessoas.

Além destas proibições de prova a lei pode estabelecer meras formalidades que, a não serem cumpridas, podem gerar nulidades no sentido dos artigos 118º e seguintes.

· Será o depoimento de um co-arguido uma prova proibida no sentido do artigo 126º? É fácil verificar que nenhuma das proibições de prova se refere ao depoimento do co-arguido.

Acresce que fazendo um percurso pelas diversas normas do CPP que permitam retirar elementos sobre o relevo probatório podemos chegar à mesma conclusão (vide, a título exemplificativo, o artigo 146º - permitindo a prova por acareação entre co-arguidos; artigo 343º, n.º 4 – admite conhecimento probatório das declarações do co-arguido contrabalançada pela garantia do arguido ser informado do que se tiver passado na audiência; artigo 344º, n.º 3, alínea a) – referente à confissão apenas se pode retirar que a confissão que não seja integral, sem reservas e coerente não pode valer como tal; artigo 133º – proibição de aquisição do conhecimento probatório como testemunho).

Por seu turno, a jurisprudência publicada admite pacificamente a fundamentação da decisão tomada em relação a um arguido nas declarações prestadas por outro arguido.

Neste sentido vide Acórdão do STJ de 4-5-94:

“o art. 133º do CPP proíbe que os co-arguidos sejam ouvidos como testemunhas uns dos outros, isto é, que lhes sejam tomados depoimentos, sob juramento, ao contrário do que se passa no sistema anglo-saxónico. Esse artigo, porém não impede que os arguidos de uma mesma infracção possam prestar declarações (cuja credibilidade é, naturalmente, mais diluída), no exercício do direito, que lhes assiste, de o fazerem em qualquer momento do processo. Não é por isso, processualmente correcto pretender equiparar um “testemunho” que lhes está legalmente vedado com as declarações que podem fazer (…) para daí se tentar extrair a conclusão errada de que estas últimas correspondem a um meio proibido de prova”.

Acórdão do STJ de 20-6-2001:

“A lei processual, com todas as garantias a que o arguido tem direito – entre as quais se destaca a de guardar silêncio quanto aos factos de que é acusado – não vai ao ponto de impedir a prestação de declarações, de forma livre e espontânea, sejam elas ou não incriminatórias ou agravatórias da responsabilidade de outros intervenientes nos factos criminosos.”

Contra esta possibilidade já se pronunciou na doutrina Rodrigo Santiago, afirmando que “as declarações assim prestadas, maxime as que o forem em audiência de julgamento, por um ou mais co-arguidos (…) não podem validamente ser assumidas como meio de prova relativamente aos outros, servindo tais declarações, no âmbito da co-arguição, única e exclusivamente como meio de defesa pessoal do arguido ou arguidos que as tiverem prestado – artigo 343º, n.º 2 do CPP. Logo, se da motivação da sentença, nos termos do artigo 374º, n.º 2 in fine do referido diploma, constar que as declarações dos co-arguidos contribuíram irrestritamente para a formação da convicção do Tribunal, verifica-se uma situação de nulidade do julgamento, por violação do disposto nos artigos 323º, alínea f) e artigo 327º, n.º 2, entre outros, todos do Código de Processo Penal.”

A argumentação do autor assenta na impossibilidade de contraditório do co-arguido por parte do outro arguido ao “não permitir ao defensor de um co-arguido instar o outro por meio do presidente do tribunal sobre as declarações que este tenha prestado e que atinjam o respectivo defendido”, sendo certo que no “seio da prova testemunhal a lei prevê expressamente que, mediante autorização do presidente, podem as testemunhas indicadas por um co-arguido ser inquiridas pelo defensor de outro co-arguido (artigo 348º, n.º 6)”.

· Não obstante, admitindo a valoração das declarações do co-arguido autores há que colocam em causa a sua credibilidade.

Teresa Pizarro Beleza sustenta que as declarações do co-arguido possuem uma diminuída credibilidade fundando-se nos seguintes argumentos em que importa atentar:

- Impossibilidade de depoimento sob juramento do arguido (vide artigo 133º que os impede de depor como testemunhas);
- Direito ao silêncio do arguido (artigo 61º) implicam forte dúvida sobre a veracidade de qualquer depoimento de um co-arguido enquanto incriminatório do outro;
- Exigência legal de coerência de todas as confissões para fazer funcionar o regime especial do artigo 344º, que aponta no sentido de não se ter demasiada confiança em co-arguidos desavindos;
- A impossibilidade de submissão ao contraditório em caso de depoimento de co-arguidos, sendo certo que o artigo 327º implica a obrigatoriedade – aliás constitucionalmente imposta pelo artigo 32º, n.º 5 da CRP – de submissão ao contraditório de todos os meios de prova apresentados em audiência, o que em caso de silêncio do arguido se torna difícil de cumprir;
- Impossibilidade de uma cross-examination em caso de depoimento de co-arguidos (ao contrário do que sucede com as testemunhas e os assistentes - artigo 348º, n.os 4, 5 e 6 e artigo 345º, n.º 2) na medida em que o CPP não prevê que os defensores dos arguidos possam pedir esclarecimentos aos co-arguidos que contra eles deponham.

Teresa Pizarro Beleza conclui assim que “o depoimento do co-arguido, não sendo, em abstracto, uma prova proibida em Direito Português, é no entanto um meio de prova particularmente frágil, que não deve ser considerado suficiente para basear uma pronúncia, muito menos para sustentar uma condenação. Não tendo esse depoimento sido controlado pela defesa do co-arguido atingido nem corroborado por outras provas, a sua credibilidade é nula.”

Sinteticamente Teresa Pizarro Beleza fundamenta a sua crítica na questão da violação do princípio do contraditório (tal como Rodrigo Santiago já se havia pronunciado) e na necessidade de corroboração por outras provas.

· Quanto ao contraditório, importa referir que tem sido admitida pela jurisprudência a possibilidade de cross-examination das declarações do co-arguido.

Neste sentido vide Acórdão do STJ de 20-06-2001:

“Também o defensor de um co-arguido pode suscitar esclarecimentos (…) ao outro co-arguido que profere declarações que sejam desfavoráveis ou incriminadoras do arguido cuja defesa lhe está confiada …”.

Sendo certo que o TC já se pronunciou no Acórdão n.º 524/97 no sentido de:

“Julgar inconstitucional, por violação do artigo 32º, n.º 5 da CRP, a norma extraída com referência aos artigos 133º, 343º e 345º, no sentido em que confere valor de prova às declarações proferidas por um co-arguido, em prejuízo de outro co-arguido quando, a instâncias destoutro co-arguido, o primeiro se recusa a responder, no exercício do direito ao silêncio.”

Posição esta que tem sido sufragada pelo STJ, vide Acórdão de 25-02-1999:

“Viola-se o princípio das garantias de defesa, quando se atribui valor probatório às declarações prestadas na audiência de julgamento por um arguido em desfavor de outro, se este está impossibilidade de efectuar, mesmo através do próprio tribunal, um contra-interrogatório”.

De salientar que o Anteprojecto do CPP prevê uma alteração importante nesta matéria ao acrescentar um n.º 4 ao artigo 345º:

“Não podem valer como meio de prova as declarações de um co-arguido em prejuízo de outro co-arguido quando o declarante se recusar a responder às perguntas formuladas nos termos dos n.ºs 1 e 2”.

· Quanto à questão da necessidade da corroboração das declarações do co-arguido por outras provas cumpre referir que este tem sido um argumento recorrente utilizado pela jurisprudência para admitir a valoração das declarações do co-arguido, ainda que o seu conteúdo não seja de fácil clarificação.

Medina de Seiça dedicou-se sobejamente a esta questão sustentando que “as declarações do co-arguido requerem uma verificação suplementar que se traduz na exigência de corroboração. Com a corroboração significa-se a existência de elementos oriundos de fontes probatórias distintas da declaração que, embora não se reportem directamente ao mesmo facto narrado na declaração, permitem concluir pela veracidade desta. A regra da corroboração traduz de modo particular uma exigência acrescida de fundamentação, devendo a sua falta merecer a censura de uma fundamentação insuficiente.”

A corroboração não poderá significar a necessidade de existência de uma contraprova pois tal implicaria uma inutilidade prática das declarações do co-arguido.

Por outro lado, é evidente que há sempre necessidade do magistrado submeter as declarações do co-arguido a uma vigilância apertada para aferir eventuais divergências entre o narrado e a realidade, ou seja, verificação quer da declaração, coerência lógica, espontaneidade, constância, verosimilhança da história narrada, do declarante, em face do seu comportamento no processo, a possível margem de interesse, etc.

A corroboração é algo mais, consiste na fiscalização da credibilidade da declaração através de elementos exteriores à própria declaração interpretáveis como confirmação dos factos da acusação.

A admissibilidade da corroboração cruzada (com declarações de outros co-arguidos) será de evitar, a não ser que se demonstre a independência das informações probatórias dos co-arguidos, como sucede no seguinte exemplo:

A decide assaltar um banco “contratando“ B apenas para o transporte de material necessário ao arrombamento e C para ir buscar, a uma determinada hora, as coisas roubadas. B e C não só se desconhecem mutuamente como ignoram a participação criminosa do outro na realização do crime – aqui deve ser de admitir a corroboração cruzada.

Caso não seja possível a corroboração as declarações do co-arguido podem ser utilizadas para justificar uma dúvida razoável no julgador conduzindo à absolvição por força do princípio in dubio pro reo.

Particularmente interessante nesta matéria dada a sua actualidade e sintetização vide o Acórdão do STJ de 22-06-2006, no qual se admite que “apesar do seu regime específico, as declarações do co-arguido não deixam de ser um meio de prova, cujas limitações o não privam da virtualidade de influenciarem relevantemente ou até fundamental ou exclusivamente a convicção dos julgadores (…) o artigo 344, n.º 3 (confissão) não prevê qualquer limitação ao exercício do direito de livre apreciação da prova, resultante das declarações do arguido”, tendo concluído que “não há um dever especial de análise crítica dos meios de prova coadjuvantes, que é o exigível nas demais circunstâncias”. Apesar de neste acórdão se ter concluído também que “a credibilidade do que por aqueles (co-arguidos) foi dito foi reforçada pelo facto de ter sido corroborado por outros meios de prova.”.

NOTAS FINAIS

a) O fundamento do impedimento do co-arguido depor como testemunha previsto no artigo 133º centra-se numa ideia de protecção do próprio arguido, consubstanciado num previlégio contra a auto-incriminação.
b) O artigo 125º estabelece o principio da admissibilidade de quaisquer provas, e do elenco das provas proibidas estabelecido no artigo 126º não consta o caso das declarações do co-arguido, as quais se deverá considerar que são possíveis como meio de prova do ponto de vista da sua legalidade.
c) O artigo 133º apenas proíbe que os arguidos sejam ouvidos como testemunhas o que significa que nada obsta a que preste declarações, nomeadamente para se desonerar ou atenuar a sua responsabilidade, o que acarreta que, não sendo meio proibido de prova, as declarações do co-arguido podem e devem ser valoradas no processo, não esquecendo o tribunal a posição que ocupa quem as prestou e as razões que ditaram o impedimento deste artigo.
d) Porém, não pode ser atribuído valor probatório às declarações prestadas na audiência de julgamento por um arguido em desfavor de outro, se este está impossibilidade de efectuar, mesmo através do próprio tribunal, um contra-interrogatório pois neste caso viola-se o princípio do contraditório, da verdade material e da igualdade de armas.
e) De acordo com a jurisprudência, a exigência do exame crítico das provas que serviram para formar a convicção do tribunal deve ser entendida não no sentido de se traduzir num detalhado exame crítico do conteúdo da prova produzida, mas antes no exame crítico dos próprios meios de prova, designadamente da sua razão de ciência e credibilidade, por forma a explicitar o processo de formação da convicção, assim se garantindo que se não tratou de uma ponderação arbitrária das provas ao atribuir ao seu conteúdo em especial força na formação da convicção do Tribunal, assumindo a corroboração por outros meios de prova argumento de destaque na valoração das declarações do co-arguido.


BIBLIOGRAFIA:

ANTÓNIO ALBERTO MEDINA DE SEIÇA, "O Conhecimento Probatório do Co-Arguido", Coimbra Editora, 1999.

TEREZA PIZARRO BELEZA, “Tão amigos que nós éramos: o valor probatório do depoimento de co-arguido no Processo Penal Português” , in "Revista do Ministério Público", nº 74, página 39.

RODRIGO SANTIAGO, "Reflexões sobre as «declarações do arguido» como meio de prova no CPP de 1987" , in "Revista Portuguesa de Ciência Criminal", Ano 4, fascículo 1, Janeiro-Março de 1994, página 27.

CARLOS ADÉRITO TEIXEIRA, “Depoimento indirecto e arguido : admissibilidade e livre valoração versus proibição de prova”, in “Revista do CEJ”, nº 2, página 127.