domingo, setembro 17, 2006

Das Escutas Telefónicas

(anotações, para powerpoint, de Pedro Miguel Lopes - as notas destinaram-se a conduzir a apresentação do tema em sessão e não foram revistas pelo seu autor)

1.
Artigo 34.º, n.º 4 da CRP:
«É proibida toda a ingerência das autoridades públicas na correspondência, nas telecomunicações e nos demais meios de comunicação, salvos os casos previstos na lei em matéria de processo criminal.»
Garantia constitucional

2.
Princípio da menor intervenção possível: necessidade, adequação e proporcionalidade (art. 18.º, n.º 2 da CRP).
Garantia constitucional
A realização da justiça e a descoberta da verdade material
Versus
A realização de direitos fundamentais dos cidadãos (direito à palavra, à reserva da intimidade da vida privada e familiar e à inviolabilidade das telecomunicações).

3.
Três requisitos, como tradução dos princípios constitucionais:
A necessidade, reportada ao momento da decisão de intercepção;
A fidedignidade, prende-se com os actos de gravação e transcrição e sua passagem a auto;
A veracidade, reportada ao momento da valoração das declarações.

4.
Regime legal (art. 187.º sgt do CPP)
A existência de um processo-crime
Como meios de obtenção de prova que são, as escutas só podem ser autorizadas depois de iniciado um inquérito, ainda que contra desconhecidos, o que ocorre com a aquisição da notícia de um crime – art. 34.º n.º 4 CRP.
(Cir. 07/92, da PGR)

5. (1) A necessidade
A tipicidade ou catalogação dos crimes passíveis de investigação por este meio:
• Crimes designados de criminalidade grave (187.º n.º 1 al. a);
• Crimes de complexa investigação e especialíssima gravidade (187.º n.º 1 al. b), c) e d);
• Crimes de dificil produção de prova (187.º n.º 1 al. e)

6. (1) A necessidade
«grande interesse para a descoberta da verdade ou para a prova» - juízo de ponderação vinculada.
• A essencialidade, subsidiariedade e excepcionalidade
e
• A idoneidade/adequação do meio.

7. (1) A necessidade
A promoção
• Pelo MP, a solicitação do OPC, ou pela APC, nos casos de urgência e de perigo na demora (art. 268.º n.º 2, por via do 269.º n.º 2 do CPP).
• Não está sujeita a qualquer formalidade (art.º 268.º n.º 3), mas deve ser sempre fundamentada.

8. (1) A necessidade
A promoção
Dirigida:
• ao JIC/juiz de comarca a quem o processo se encontra distribuído, ou;
• Ao do lugar onde se efectivar a comunicação
• Da sede da entidade competente para a investigação criminal.

9. (1) A necessidade
A decisão judicial
O despacho do juiz deverá ser, por um lado, um exame crítico às razões apontadas pelo MP e, por outro, dece ser fundamentado de facto e de direito, atenta a atrás apontada ponderação vinculada de interesses.

10. (1) A necessidade
A decisão judicial
• Deve sempre estabelecer o âmbito temporal da escuta a realizar:
RC 16/09/2001: entendeu excessivo a fixação de um prazo de 30 dias para o efeito.
11. (1) A necessidade
A decisão judicial
• Delimitação do âmbito subjectivo da escuta: universo determinado de pessoas ou ligações telefónicas.
• Pode ser autorizada a identificação do(s) IMEI, o acesso ao trace back e outros serviços.
• A questão da fixação pelo IMEI e não pelo posto (RL 10/12/2003)

12. (1) A necessidade
A decisão judicial
O Defensor: a regra é a da proibição da possibilidade de autorizar/ordenar a intercepção e a gravação de conversações entre este e o arguido (art. 187.º n.º 3).

12A. (1) A necessidade
A decisão judicial.
RP 8/03/2000: Tal proibição abrange o período em que o advogado, embora ainda não tendo juntado procuração aos autos, exerce já o mandato de defender o arguido.

13. (1) A necessidade
A decisão judicial
Excepção à proibição «salvo se o juiz tiver fundadas razões para crer que elas constituem objecto ou elemento de crime»:
A escuta só será possível quando haja fundada suspeita de o defensor ser, ele próprio, co-autor ou cúmplice do crime de catálogo imputado ao seu defendido.

14. (1) A necessidade
A decisão judicial
Portadores de segredo profissional (135.º):
CA: apena serão admissíveis nas situações em que haja indícios de que as suas conversações constituam «objecto ou elemento de crime», mas bastando que seja um ilícito penal relacionado com o catalogar objecto da escuta – favorecimento pessoal, receptação, auxílio material.

15. (1) A necessidade
A decisão judicial
Pessoas com direito de recusa de depoimento (art. 134.º): negação de soluções de privilégio.
Mas, ainda assim, deve fazer-se intervir exigências acrescidas em sede de subsidiariedade.

16. (1) A necessidade
Questões.
• poderá ser ordenada em sede de julgamento, atento o disposto no art.º 340.º n.º 1?
• Tendencialmente não, excepto se, por exemplo se destinar a uma peritagem à voz que se intercepta e grava, para efeito de identificação.

17. (1) A necessidade
Auto de intercepção e gravação – art. 188.º n.º 1.
TC 407/97, 21MAI: não pode decorrer um longo hiato de tempo sem que a actividade do JIC se encontre materializada nos autos, de modo a permitir uma decisão:
• atempada de transcrever/destruir;
• necessidade da sua manutenção/alteração.

18. (2) A fidedignidade
Auto de intercepção e gravação – art. 188.º n.º 1
(Cir. 14/92, de 19.11, da PGR)
Este auto destina-se tão somente a dar fé à operação de intercepção enquanto tal.

19. (2) A fidedignidade
Auto de intercepção e gravação – art. 188.º n.º 1
Este auto deve inserir:
• Menção do despacho judicial de autorização;
• Identidade da pessoa que procedeu à intercepção;
• Identificação do telefone interceptado;
• Tempo, modo e lugar da intercepção
• Indicação das passagens consideradas relevantes.

20. (2) A fidedignidade
Auto de transcrição – art. 188.º n.º 3
O juiz consulta o auto de intercepção e ouve as gravações, podendo se necessário ser coadjuvado por um polícia ou nomear um tradutor, e pondera quais as conversações que assumem relevo para a prova.

21. (2) A fidedignidade
Auto de transcrição – art. 188.º n.º 3
Se assim o entender, poderá ordenar (ao OPC) uma transcrição mais ampla ou mais restrita do que aquela que lhe é proposta.
Esta transcrição assume a forma de auto (art. 101.º, n.º 2 e 3)

22. (2) A fidedignidade
Auto de transcrição – art. 188.º n.º 3
As fitas gravadas, quando transcritas, devem ser apensas aos autos de forma a permitir o exercício do contraditório quanto ao conteúdo da transcrição (art. 101.º n.º 3).

23. (2) A fidedignidade
Auto de destruição – art. 188.º n.º 3
• redigido de forma genérica, quanto ao conteúdo das gravações (simples indicação da sua natureza ou tema).
• Dever de segredo.
• Cir. n.º 15/94, de 14.10, da PGR: especial dever de cuidado dos magistrados do MP (matérias cobertas pelo segredo profissional)

24. (2) A fidedignidade
Questões.
• Qual o papel do MP em todo este procedimento, atendendo ao seu papel de “dominus” do inquérito?
• Fiscalização post factum?

25. (2) A fidedignidade
Questões.
• Não devia o JIC presidir à destruição, em vez de a ordenar?
• A destruição do material não relevante não poderá limitar o exercício do contraditório por parte do visado pela escuta?

26. (2) A fidedignidade
Valor probatório
STJ 20/11/2002 (Proc n.º 3173/02-3.ª): uma vez transcritas em auto, passam a constituir prova documental, que o tribunal pode valorar de acordo com a regras da experiência.

27. (3) A veracidade
Valor probatório
TEDH, Ac. Ludi, de 15JUN92, A238, pg. 19 §40:
Admissibilidade da escuta, mesmo quando existe um agente infiltrado que provoca a conversa registada.

28. (3) A veracidade
Valor probatório
• Audição de conversas privadas que acontecem quando, na sequência de uma escuta legalmente autorizada, e porque os interlocutores não colocam devidamente os auscultadores, continuam a gravar-se as conversações que ocorrem na privacidade da habitação -«conversas entre 4 paredes».

29. (3) A veracidade
Valor probatório
Declarações do próprio arguido – servem como meio de prova sobre os factos criminosos que lhe venham a ser imputados, podendo eles depois vir a esclarecê-las ou a tomar qualquer outra posição (+) ou são uma forma larvada de obtenção de confissões não livres?

30. (3) A veracidade
Conhecimentos fortuitos
O que são conhecimentos de investigação?
• apenas os directamente relacionados com o crime catalogar que motivou a escuta, ou ainda
• a um outro delito (catalogar ou não) que esteja baseado na mesma situação histórica da vida?

31. (3) A veracidade
Conhecimentos fortuitos – STJ 23/10/2002 (Proc. 2133/02 – 3.ª)
1.º - em geral e em princípio é permitido o aproveitamento em determinado processo de material probatório recolhido noutro, desde que neste a respectiva recolha tenha obedecido às prescrições legais.

32. (3) A veracidade
Conhecimentos fortuitos – STJ 23/10/2002 (Proc. 2133/02 – 3.ª)
2.º - os dados legalmente obtidos para determinados factos (os do crime catalogar) são extensíveis à prova dos demais factos (objecto do processo) – conhecimentos de investigação.
[- o caso específico da associação criminosa. ]

33. (3) A veracidade
Conhecimentos fortuitos – STJ 23/10/2002 (Proc. 2133/02 – 3.ª)
3.º - são admissíveis os dados obtidos fortuitamente desde que a recolha tenha obedecido aos requisitos legais inscritos no art. 187.º (crime catalogar + estado de necessidade investigatório).

34. (3) A veracidade
Sentido substantivo da «nulidade» do 189.º
• nulidade dependente de arguição – Costa Pimenta e Tolda Pinto
• Nulidade dependente de arguição apenas quanto à não verificação dos quesitos formais do 188.º - Maia Gonçalves
• Verdadeira proibição de prova – GMS + CA

35. (3) A veracidade
Outras consequências das escutas ilícitas
• Eventual crime de violação de correspondência ou de telecomunicações – art. 194.º CP;
• A prática de eventuais ilícitos disciplinares.

36. (3) A veracidade
Efeito à distância da invalidade
1.º a prova obtida através de escutas ilegais deve ser considerada inexistente.
2.º eventual autonomia da prova subsequente – processo autónomo de obtenção de conhecimentos

37. The end