segunda-feira, abril 28, 2008

Exames

(Notas para powerpoint de Paulo Capela Rodrigues, para a sessão de 22 de Novembro de 2007)

Artigo 171º - Pressupostos
Por meio de exames das pessoas, dos lugares e das coisas, inspeccionam-se os vestígios que possa ter deixado o crime e todos os indícios relativos ao modo como e ao lugar onde foi praticado, às pessoas que o cometeram ou sobre as quais foi cometido.

Os exames podem ter por objecto
Coisas
Lugares
Pessoas
· enquanto submetidas a exame, são objecto de observação, mas nessa observação, há-de respeitar-se sempre a sua dignidade de pessoa.

Momento ?
Durante o inquérito e a instrução: os exames serão, normalmente, executados por órgãos de polícia criminal a quem compete igualmente assegurar as providências cautelares necessárias a garantir o não extravio dos meios de prova.
Em audiência de julgamento:
assume especial relevância o exame efectuado ao local pelo Tribunal (artº. 354º CPP)

Antes de iniciado o procedimento:
como providência cautelar quanto aos meios de prova. O artº. 249º CPP atribui aos O.P.C. competência para praticar os actos cautelares necessários e urgentes para assegurar os meios de prova (artº. 249º, nº2, al. a) ). (Ver ainda artº. 171º nº 2.)


Exames vs Perícias
O CPP distingue os exames, que qualifica como meios de obtenção da prova, da perícia, que qualifica como meio de prova. Parece que a distinção assenta essencialmente em que a perícia é uma interpretação dos factos feita por pessoas dotadas de especiais conhecimentos técnicos, científicos ou artísticos. (Prof. Germano Marques da Silva) (Ver artº. 151º CPP)

Perícias:
Os peritos tiram dos vestígios as ilações que eles consentem e são estas ilações ( as conclusões periciais) que são submetidas às autoridades para sua apreciação.
Conclusões periciais são os meios de prova. (Ver artº. 157º, nº1, 1ª parte.)

Exames:
Ou as autoridades judiciárias se apercebem directamente dos vestígios e indícios pela inspecção do local, das pessoas ou das coisas, e o exame é um meio de obtenção de prova;
Ou indirectamente, através do auto elaborado pelo O.P.C. em que se descrevem os vestígios que o crime deixou e os indícios relativos ao modo e ao lugar onde foi praticado.

Frequentemente a descoberta dos indícios tem já de ser feita por peritos pois não está ao alcance de todos. Por isso o artº. 151º dispõe que a prova pericial tenha lugar não só para a apreciação dos factos, mas também para a sua percepção.

Importância da distinção?
Nas perícias, porque se exigem aqueles conhecimentos especiais, o juízo técnico, científico, artístico dos peritos presume-se subtraído à livre apreciação do julgador. (artº. 163º, nº1)
Nos exames, inspeccionam-se os vestígios que possa ter deixado o crime. Podem depois ser objecto de perícia ou valorados directa e livremente pela autoridade judiciária. (Ver artº. 127º)

Do consenso à divergência ...
Artigo 172º - Sujeição a exame
· Se alguém pretender eximir-se ou obstar a qualquer exame devido ou a facultar coisa que deva ser examinada, pode ser compelido por decisão da autoridade judiciária competente.
· É correspondentemente aplicável o disposto no nº2 do artigo 154º e nos nº 5 e 6 do artº 156º .
· Os exames susceptíveis de ofender o pudor das pessoas devem respeitar a dignidade e, na medida do possível, o pudor de quem a eles se submeter. Ao exame só assistam quem a ele proceder e a autoridade judiciária competente podendo o examinando fazendo-se acompanhar de pessoa da sua confiança, se não houver perigo na demora, e devendo ser informado de que possui essa faculdade.

O que se entende por “compelir”?
Importa considerar que:
entre os deveres processuais do arguido ressalta o de se sujeitar a diligências de prova artº. 61º, nº3, al. d)
são nulas as provas obtidas mediante tortura, coacção ou, em geral, ofensa da integridade física ou moral das pessoas. (artº 126º, nº1)
são ofensivas da integridade física as provas obtidas mediante a utilização da força fora dos casos e dos limites permitidos pela lei artº.126º, nº2, al. c)
O direito ao silêncio (artº 61º, nº1, al. c)), não se restringe à palavra, mas inclui outras formas de participação/colaboração activa ou tolerância passiva na recolha e produção de prova. (Princípio da não auto-incriminação).

Artigo 32º C.R.P. - Garantias de Processo Criminal
São nulas todas as provas obtidas mediante tortura, coacção, ofensa da integridade física ou moral da pessoa, abusiva intromissão na vida privada, no domicílio, na correspondência ou nas telecomunicações.
Os meios de obtenção de prova regulados na lei, interferem, com maior ou menor intensidade, com a garantia constitucional da liberdade e da reserva da vida privada.
Doutrina e jurisprudência têm entendido que cumpre à lei ordinária fornecer o critério da conformidade constitucional de tais intromissões na liberdade ou na vida privada do cidadão.
Critério do grande interesse para a descoberta da verdade (ex: artº. 179º, nº1, al. c), artº. 181º, nº1 e artº. 187º, nº1) - situações em que a prova não é alcançável de outra forma ou só muito dificilmente o seria (Princípio da Subsidiariedade)

A legitimidade dos meios de obtenção de prova encontra sentido na permanente e instável tensão entre os direitos fundamentais do cidadão e as necessidades da prevenção e repressão dos crimes. Fundamento jurídico dessa legitimidade está no artigo 18º, nº2, CRP.

Nesse sentido as modalidades mais invasivas de meios de obtenção de prova só podem ser ordenadas ou autorizadas pelo juiz. (artº. 269º, nº1, al. b)
No entanto, há autores que defendem que se o exame implicar uma intervenção intracorporal será necessário o consentimento do próprio ou de quem o legalmente represente.
Referem a propósito o artigo 152º, nº4 do DL 44/2005 de 23/02 (Código da Estrada): a recusa do condutor a se submeter aos exames para a detecção de álcool ou estupefacientes é punida por crime de desobediência, não se prevendo qualquer forma de constrangimento físico de recusante.

No mesmo sentido ver artigo 53º, nº3 e nº4 do DL 15/93 de 22/01 (Tráfico e consumo de estupefacientes)
Outra solução parece ter sido adoptada nos artigos 43º, nº4 e 52º, nº3 dos mesmo diploma

Em tom de conclusão
Nos termos do artigo 173º a autoridade judiciária ou o O.P.C. podem determinar que alguma ou algumas pessoas se não afastem do local do exame, se necessário com recurso à força pública.
Trata-se de um constrangimento da liberdade perfeitamente justificado pelos superiores interesses da descoberta da verdade.


Jurisprudência
Acórdão da Relação do Porto de 2 de Maio de 2007 (proc. 6541/05 4ªsec)É inválida a prova obtida através de exame à saliva, pelo método de zaragatoa bucal, do suspeito de um crime de homicídio, contra a sua vontade, se o exame, ordenado durante o inquérito pelo Ministério Público, não foi previamente autorizado pelo juiz de instrução.
Acórdão do T.C. nº 155/2007
i) julgar inconstitucional, por violação do disposto nos artigos n.ºs 25.º, 26.º e 32.º, nº 4, da Constituição, a norma constante do artigo 172.º, nº 1, do Código de Processo Penal, quando interpretada no sentido de possibilitar, sem autorização do juiz, a colheita coactiva de vestígios biológicos de um arguido para determinação do seu perfil genético, quando este último tenha manifestado a sua expressa recusa em colaborar ou permitir tal colheita;
ii) consequencialmente, julgar inconstitucional, por violação do disposto no artigo 32.º, nº 4, da Constituição, a norma constante do artigo 126º, nºs 1, 2 alíneas a) e c) e 3, do Código de Processo Penal, quando interpretada em termos de considerar válida e, por conseguinte, susceptível de ulterior utilização e valoração a prova obtida através da colheita realizada nos moldes descritos na alínea anterior.No mesmo sentido, acórdão T.C. nº 228/2007